O Meu Testamento, Maria José Pires dos Santos

«De minha saudosa Mãe, consola-me dizer que, cinco dias antes de morrer – lapso de tempo precisamente pre­visto por ela –, me tranquilizou com a confissão de que havia já confiado nos méritos do Salvador, obtidos pela Sua morte na Cruz. E isto, quinze anos depois do meu regresso dos Estados Unidos!

A tristeza e a mágoa que me oprimem por virtude da incredulidade dos meus queridos, só Deus conhece. O hor­ror que me causa a perspectiva dos meus amados serem lançados na perdição eterna, por rejeitarem tão impru­dentemente a misericórdia divina, só Ele o conhece tam­bém. É que todos eles são luz dos meus olhos, pedaços como que arrancados ao meu próprio coração. A perspec­tiva da sua eterna perdição, tem-me feito chorar rios de lágrimas, e quando penso nos pequeninos que há na famí­lia e na indiferença dos pais quanto ao seu futuro espiritual, a minha amargura sobe de ponto, parecendo dilatar-se-me dentro do peito o amor que voto a esses pequeninos, ao vê-los na contingência de se tornarem vítimas – paradoxo terrível! – da ignorância espiritual daqueles que lhes de­ram o ser e que, afinal, tanto lhes querem!

Foi, pois, pensando nos meus queridos e no povo da minha terra que desejaria ver salvos e felizes na sua obe­diência a Deus e na sua comunhão filial com Ele, que concebi a ideia de escrever alguma coisa em forma de livro, como que para perpetuar a obra que me permitiu iniciar na minha terra e que tantas lágrimas me tem custado!

Ao escrever as palavras que constituirão o contexto desta modesta obra – a melhor herança que legarei aos meus e ao povo da terra em que vi pela vez primeira, a luz do Mundo – sinto-me consolada pela certeza de que até depois da minha partida para o Senhor, continuarei, por este trabalho escrito, pregando o Evangelho da sal­vação, e de que, como consequência, algumas almas mais, dentro da minha família e do meu povo, se renderão Aquele que, na Cruz, expiou os pecados de todo o que n’Ele crer e cujo sangue é poderoso e suficiente para a purificação das nossas almas.

Que assim seja é o ardente desejo do meu coração e a fervorosa oração que estou dirigindo ao Senhor, a Quem desejo também que sejam tributados, por quem ler, como o são por quem escreve o presente trabalho, toda a honra, glória e louvor, agora e para todo o sempre.

Chança, 5-2-1945.

Maria José Pires dos Santos»

Maria José Pires dos SANTOS
O meu testamento, Lisboa : Publicações Evangélicas Portuguesas, 1965.

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